Divaldo Franco
Professor, médium e conferencista
Neste báratro em que estamos vivendo, quando os valores éticos e morais, tanto quanto os sentimentos de beleza e compreensão, parecem haver desaparecido, vale a pena recordarmos de que há muita lição de vida chamando-nos à ordem e ao amor.
Recordo-me de uma cena que me foi narrada por uma querida amiga, que se passou numa feira livre em Porto Alegre. Subitamente uma senhora, que se dizia empregada doméstica, começou a chorar e a lamentar-se:
– Que será de mim? Fui roubada… A carteira com dinheiro da feira desapareceu e a patroa não acreditará em mim…
Houve uma consternação em seu entorno. Nesse momento, um pivete, como eram chamados então, os meninos de rua, gritou, exultante:
– Calma, senhora! Eu achei a sua carteira… E a entregou.
A senhora, ainda em lágrimas, examinou o conteúdo e após disse:
– É uma pena eu não poder recompensá-lo, porque este dinheiro não é meu. O garoto, que fora certamente o usurpador, respondeu, jovial:
– Não precisa, você está sorrindo…
Não há muito, numa cidade da África do Sul, sucedeu-me algo muito curioso. Descemos com os amigos para o desjejum e subitamente ouvi uma voz pedindo-me para abraçar um garçom. Relutei, achando estranha a solicitação. Quando, porém, ele se acercou de mim, pedi-lhe algo especial e ele disse que o faria. Naquele instante eu o abracei. Tomado de susto, ele tentou desembaraçar-se e perguntou-me, intrigado:
– Por que o senhor me está abraçando?
Eu respondi-lhe com tranquilidade:
– Em razão da sua gentileza.
Ele, então, acrescentou:
– Mas eu sou pago para isso…
Eu sorri e nada mais acrescentei.
O meseiro serviu-me, conforme eu havia solicitado, e depois indagou-me pelo meu nome, etc. Respondi-lhe com bonomia.
No dia seguinte não desci ao desejum e ele perguntou aos amigos por que eu não o havia feito. Explicaram que eu estava com indisposição estomacal.
De imediato ele foi ao nosso apartamento levando chá, torradas e bolachas, sem que fossem solicitados. Estranhei, mas pedi-lhe para entrar. Sugeri que se sentasse. Logo depois ele voltou a perguntar-me qual a razão do meu gesto. Após explicar-lhe, ele me elucidou:
– Não mais existe aqui legalmente o apartheid. No entanto, ele permanece. Eu tenho 42 anos e nunca nenhum branco deu-me a mão, quanto mais abraçar-me. Sempre fui visto como uma coisa, um lixo… Mas ontem senti-me gente e quero agradecer-lhe. Narrou-me a sua história, o câncer de próstata que estava padecendo e programando suicidar-se… Ante o abraço recebido, ele sentiu-se cidadão, gente, e iria lutar.
No dia seguinte, quando eu estava de saída, ele veio agradecer com a família, e eu lhe respondi:
– Não é necessário nada. Você está sorrindo!
Façamos alguém sorrir hoje!
Artigo publicado no jornal A Tarde, coluna Opinião, de 21 março de 2019.